domingo, 28 de abril de 2019

MORREU KAZUO KOIKE, CO-CRIADOR DE “LOBO SOLITÁRIO”


                Este mês de abril foi difícil para os fãs dos quadrinhos nipônicos em todo o mundo. Além do falecimento de Kazuhito Kato, mais conhecido como “Monkey Punch”, autor da clássica série “Lupin III”, outro artista de renome do mercado de mangás no Japão também faleceu. Desta vez, foi Kazuo Koike, que morreu no último dia 17, aos 82 anos. Curiosamente, o motivo da morte de Koike foi o mesmo de Kato: ambos foram vitimados por uma pneumonia. Koike, aliás, havia manifestado seu pesar pelo passamento de Kazuhito Kato, a quem se referiu como seu primeiro “rival” profissional no mercado de mangás, uma vez que em suas respectivas épocas, seus trabalhos no mercado editorial competiam entre si pela preferência dos leitores da revista Weekly Manga Action, onde suas principais séries foram publicadas. Os fãs do trabalho de ambos mal poderiam imaginar que, após a perda de Monkey Punch, Kazuo Koike engrossasse a lista de perdas no mercado editorial.
                Natural da cidade de Daisen, na ilha de Honshuu, Koike, cujo nome real era Seishuu Tawaraiya, nasceu em 8 de maio de 1936. Ele iniciou sua carreira profissional na área dos mangás em 1960, quando se tornou assistente de Takao Saito, criador de uma das mais longevas séries de mangás publicada até hoje, Golgo 13, com Koike roteirizando várias aventuras do personagem. Em 1970, Koike, em parceria com Goseki Kojima, criaria aquela que é sua obra mais famosa mundialmente, a série “Kozure Okami”, conhecida no Ocidente como “Lobo Solitário”, que foi publicada na revista Weekly Manga Action, tendo estreado em setembro daquele ano, e sendo encerrada em abril de 1976, totalizando 28 volumes encadernados. Lobo Solitário tornou-se uma série muito popular no Japão na época, a ponto de ganhar vários filmes com atores, estrelados por Tomisaburo Wakayama, além de peças teatrais, e uma série de TV estrelada por Kinnosuke Yorozuya.
                Na história, que se passa no período Edo da história japonesa, somos apresentados a Itto Ogami, um exímio guerreiro samurai que ocupa o posto de assassino “oficial” do shogun, a autoridade de fato no Japão, tendo a tarefa de eliminar os inimigos de seu senhor, além de executar quaisquer pessoas que o shogun determinar. Mas uma trama sórdida perpetrada pelo clâ Yagyu, inimigo político da família Ogami, faz com que Itto seja acusado de traição contra o shogun, e ainda assassinando toda sua família, de modo que, pelas regras da honra dos guerreiros samurais, ele deveria se matar para redimir-se de sua culpa, de modo que a família Yagyu assumiria a posição de assassina oficial do shogun, aumentando sua força e influência. Mas Ogami, contrariando as expectativas dos inimigos, não se matou, preferindo tornar-se um samurai errante. Ele foge com seu filho, Daigoro, passando a viajar de forma errante pelo Japão, aceitando trabalhos diversos para suas habilidades de samurai, ao mesmo tempo em que foge de seus algozes e planeja vingança contra eles. Ogami é um samurai de habilidade ímpar, e possuidor de conhecimentos que o tornam um guerreiro temível. A força do enredo, e o impacto visual da arte de Kojima exerceram forte influência em inúmeros artistas na época, e posteriormente, e não apenas no Japão. Entre os artistas ocidentais de renome que não escondem sua admiração pela série de Kazuo Koike está Frank Miller, que usou sua inspiração na série nipônica em suas criações Ronin e Sin City.
                Mas Koike trabalhou em várias outras séries, várias delas em parceria com outros artistas. Uma delas foi “Shurayuki-hime”, conhecida como Lady Snowblood, junto com Kazuo Kamimura, publicada entre 1972 e 1973 na revista Weekly Playboy da editora Sueisha, em 4 volumes encadernados, e que acabou ganhando também um filme com atores. Na mesma época, lançou também “Kubikiri Asa”, ou “Samurai Executor”, também em parceria com Goseki Kojima, cuja história até se passa na mesma época de Lobo Solitário, com publicação na revista Shuukan Gendai da editora Kodansha, em 10 volumes encadernados, de 1972 a 1976. A exemplo de Lobo Solitário, Samurai Executor também ganhou uma adaptação como série de TV, estrelada por Go Wakabayashi, que interpretou o personagem principal da história, o também samurai Yamada Asaemon.
                Na segunda metade dos anos 1970, Koike deu início ao seu projeto Gekiga Sonjuku, que consistia em um curso universitário destinado a ensinar as pessoas interessadas na área em como se tornar um artista profissional de mangá. E entre os alunos que frequentaram o seu curso encontramos os nomes de Rumiko Takahashi (autora das séries “Urusei Yatsura”, “Maison Ikkoku”, “Ranma ½”, e “Inuyasha”, todos mangás de grande sucesso, entre outras séries), Tetsuo Hara (o criador de “Hokuto no Ken”), Takayuki Yamaguchi (autor de “Apocalipse Zero” e “Shigurui”), e Keisuke Itagaki (criador de “Grappler Baki”), entre outros que se tornaram grandes artistas profissionais no mercado japonês.
                Outra parceria prolífica de Koike foi com o artista Ryoichi Ikegami. Juntos, eles criaram a série “Kizuoibito” (“Wounded Man”, em inglês), compilada em 11 volumes, tendo sido publicada na revista Big Comic Spirits da editora Shogakukan de 1983 a 1986. Ambos retomariam a parceria na série “Kuraingu Furiman” (“Crying Freeman”), publicada também na Big Comic Spirits, de 1986 a 1988, rendendo 10 volumes encadernados. Ambas as séries ganhariam versão em animação, lançadas diretamente para o mercado de vídeo japonês, no formato OVA. Wounded Man teve 5 episódios, enquanto Crying Freeman teve 6 capítulos. Esta série ainda ganharia uma produção longa-metragem para cinema franco canadense estrelada por Mark Dacascos.
                Em 2003, Koike produziu a continuação da saga de Lobo Solitário, “Shin Kozure Okami” (“O Novo Lobo Solitário”) agora estrelada pelo filho de Itto Ogami, Daigoro, em parceria com o artista Hideki Miri Mori substituindo Goseki Kojima, que havia falecido em janeiro de 2000, aos 71 anos. Esta série retoma a história de onde a série original havia parado, e foi publicada na revista Weekly Post da editora Shogakukan, até 2006, totalizando 11 volumes.
                Durante sua longa carreira, Koike também roteirizou algumas histórias de super-heróis das editoras dos Estados Unidos, entre elas X-Men, de forma esporádica. O artista recebeu diversos prêmios ao longo dos anos, tanto no Japão quanto nos Estados Unidos e na Europa, por seus diversos trabalhos.
No Brasil, suas obras mais conhecidas são justamente Lobo Solitário e Crying Freeman, que foram publicados por mais de uma editora. A saga de Itto Ogami foi lançada em nosso país originalmente pela editora Cedibra, em 1988, de forma incompleta, com apenas 9 volumes publicados. Em 1990, a Nova Sampa Editorial lançaria a série novamente no mercado, chegando a 14 volumes lançados. Somente em 2004 os leitores nacionais teriam a chance de conhecer por completo a história mais famosa de Koike, com a Panini lançando todos os 28 volumes de Lobo Solitário. Recentemente, a Panini relançou a obra no mercado nacional, com um novo acabamento e tradução, tendo lançado também todos os 11 volumes de O Novo Lobo Solitário, a sequência da história, permitindo aos fãs e leitores verem toda a história da saga de Itto Ogami e seu filho Daigoro. Crying Freeman seria publicado, incompleto, pela Nova Sampa, com 4 volumes, em 1990, e completo, pela Panini, em 2006 e 2007. O filme live-action com Mark Dacascos foi lançado no mercado de vídeo nacional, pela Paris Filmes, assim como todos os filmes de Lobo Solitário produzidos no Japão nos anos 1970, pela Versátil, todos em DVD. A versão animada de Freeman continua inédita por aqui, mas a série de TV do Lobo Solitário chegou a ser exibida por aqui nos anos 1980, com o nome de “O Samurai Fugitivo”, pela TVS/SBT.
                Outra obra de Koike que chegou a ser lançada por aqui foi Shurayuki-hime, através da editora Conrad, que publicou toda a série entre 2006 e 2007. Várias das outras obras do artista nunca chegaram a ser publicadas por aqui, nem mesmo quando os quadrinhos japoneses se tornaram uma febre no mercado editorial nacional na década passada e se tornando relativamente comuns em nosso país desde então.
                Koike já vinha tendo problemas de saúde devido à idade avançada, e vinha tentando se manter ativo tanto quanto podia, como forma de manter a saúde em boas condições. Todos os fãs, no Japão e pelo mundo afora, lamentam sua perda. Descanse em paz, velho guerreiro. Suas obras, felizmente, continuarão a ser publicadas, mostrando o seu talento e sua capacidade de contar histórias interessantes, capazes de cativar leitores em todo o mundo.


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