domingo, 5 de julho de 2020

COLUNA HQ – JULHO DE 2020 - ADEUS, SUPER SENTAI NO BRASIL?


            Depois de um tempo de inatividade devido a problemas de cunho pessoal, eis que retomo um pouco as matérias no HQPRESS, trazendo de volta a COLUNA HQ, em um estilo de editorial que experimentei em 2014, mas que acabei abandonando devido à falta de tempo para se escrever sobre assuntos que mereciam maior discussão do que simplesmente serem noticiados. Pretendo retomar estes textos, embora sem uma periodicidade exata, devido aos percalços vividos no momento, em um panorama extremamente complicado como o que estamos vivenciando no mundo inteiro. Por enquanto, fiquem com a minha primeira edição da COLUNA HQ de 2020, abordando um assunto que acho pertinente dar uma opinião mais ampla sobre o tema. Uma boa leitura a todos, e em breve espero estar trazendo novos textos...

ADEUS, SUPER SENTAI NO BRASIL?

A série Changeman (acima), atualmente em reprise na TV Bandeirantes, foi um ícone das séries Super Sentai exibidas no Brasil, no final dos anos 1980, junto com Flashman (abaixo). E agora estas séries deixarão de ser exibidas oficialmente em nosso país após o final dos contratos atuais de licenciamento.


                Algumas semanas atrás, iniciou-se uma discussão entre os amantes das produções japonesas no Brasil, referentes ao gênero dos tokusatsus. O assunto em questão teve início com o fato de Nelson Sato, empresário do ramo de licenciamento, ter afirmado que, após vencerem os atuais contratos que ele possui a respeito da série Super Sentais, dificilmente eles serão renovados, o que implica dizer, sem meios termos, que poderemos não ter mais exibições oficiais destas séries no nosso país. O motivo foi o fato de que a Hasbro, uma das empresas fabricantes de brinquedos do mundo, ter adquirido, junto com a propriedade da série Power Rangers, os direitos mundiais das séries originais que são depois adaptadas para os Power Rangers, a franquia Super Sentai, e que a empresa não estaria disposta a licenciar as séries originais pelos valores até então existentes.
                Foi o que motivou uma grande discussão entre os fãs, e uma quase completa demonização da Hasbro por causa disso, como se a empresa tivesse praticamente decretado o fim dos Super Sentais no Brasil, e que por causa dela, só poderemos ver as adaptações, os Power Rangers, daqui por diante. Mas, a Hasbro é a única culpada por isso?
                Desde que Haim Saban conseguiu produzir a primeira série Power Rangers, em 1993, os fãs nacionais de tokusatsu discutem sobre não termos tido mais a chance de vermos as séries Super Sentai no Brasil. Produzida pela Toei desde fins dos anos 1970, a franquia Super Sentai é hoje um dos carros-chefe da divisão de entretenimento juvenil do estúdio, ao lado das franquias Kamen Rider e Pretty Cure. Na segunda metade dos anos 1980, os brasileiros tiveram contato com estas produções pela primeira vez, quando a saudosa Everest Vídeo lançou as primeiras fitas VHS da série Changeman no mercado nacional, e também conseguiu que a TV Manchete exibisse a série.
                Foi um grande sucesso logo de cara, o que motivou a vinda das séries sequentes, Flashman e Maskman, além de outra série anterior a todas elas, Google Five. Junto com outras produções japonesas como Jaspion, Lion Man, Jiraya, Metalder, Machine Man, Bicrossers, Gavan, entre muitas outras, os brasileiros, que já tinham visto outras produções nipônicas como National Kid e Ultraman, redescobriram o gosto pelas aventuras live-actions dos heróis japoneses. O problema é que, tantas produções em um espaço de tempo curto acabaram por saturar o gênero, que precisava de uma pausa para que os fãs pudessem respirar um pouco.

Em 1993, depois de várias tentativas, Haim Saban resolveu “adaptar” a série Zyuranger com novos roteiros e atores americanos no lugar dos episódios japoneses. O resultado foi um sucesso fenomenal em todos os lugares onde a nova produção foi exibida, inclusive no Brasil.

                Mas aí, em 1994, eis que estreou na TV nacional Power Rangers, adaptação feita pela empresa Saban, utilizando cenas de uma série Super Sentai chamada Zyuranger, onde as cenas com os atores japoneses eram substituídas por cenas com atores americanos, além de possuírem roteiros completamente diferentes, em que pese os heróis e vilões serem mantidos. Foi um sucesso estrondoso em vários países, inclusive no Brasil, o que decretou, de certa forma, o fim das séries Super Sentai por aqui. Tudo o que tivemos, desde então, foram reprises das quatro séries que já haviam sido exibidas, e só. E mesmo assim, por períodos não muito longos.
                Costumou-se a ter como fato e verdade que a Saban “proibia” a comercialização das séries Super Sentai para o Ocidente, que só poderia comprar a versão “Power Rangers”, e com isso, os fãs criaram uma relação de amor e ódio em relação à Saban, culpando-a por não termos mais como assistir a novas séries Super Sentai por aqui. E muitos ainda acreditam nisso até hoje, mesmo que a série tenha passado pelas mãos da Disney, voltado para a Saban, e agora esteja nas mãos da Hasbro. Os americanos são os grandes culpados por não podermos ver as novas produções Super Sentai no Brasil, e fim de papo. Não é bem assim...
                Em primeiro lugar, precisamos lembrar que as produções de tokusatsu, entre elas a franquia Super Sentai, assim como todas as produções de animação japonesa, são feitas para se gerar lucro. Não é por menos: são séries que possuem um custo de produção, que precisa ter um retorno. E como se gera esse retorno? Sendo exibida na TV, onde a emissora paga pelo direito de exibição, mas não só com este recurso. São licenciados vários produtos para que os fãs possam comprar, dos mais variados tipos, entre eles, brinquedos. E, quanto mais estes produtos venderem, mais a Toei, ou qualquer outro estúdio de produção, ganha dinheiro, e investe em novas séries. É um esquema que dá certo, e que graças a eles é que vemos o Japão produzindo não apenas séries live-actions, mas inúmeras animações que fazem sucesso mundial, como One Piece, Naruto, ou Cavaleiros do Zodíaco, só para citar alguns nomes. Sem lucro, não dá para continuar produzindo, e para dar lucro, as séries precisam ganhar os fãs, fazendo sucesso entre eles, pois é com este sucesso que se alavanca a venda dos produtos licenciados. E não é uma estratégia usada apenas pelos japoneses. Nos saudosos anos 1980, tínhamos muitos seriados americanos que faziam sucesso sendo exibidos em nossas emissoras de TV. Séries como ChiP’s, Esquadrão Classe A, Águia de Fogo, Supermáquina, Moto Laser, entre muitos outros, ganharam vários brinquedos lançados no mercado nacional, que faziam a festa das crianças que assistiam essas séries. Isso começou a ser praticado no Japão no início dos anos 1970, e nunca mudou desde então, sendo um recurso vital para se gerar lucros que permitam que a indústria de entretenimento siga funcionando.

Com um esquema de marketing massivo e bem planejado, a marca Power Rangers virou um fenômeno comercial, com centenas de produtos licenciados, entre livros infantis, jogos de videogame, quadrinhos, e claro, brinquedos, que fizeram a cabeça da Bandai, que faturou horrores com isso.
                A Toei, maior estúdio de produção do Japão, tem como meta o mercado do próprio Japão. Antes de pensarem em vender qualquer série, esta tem que fazer sucesso entre o público japonês, e a concorrência costuma ser bem renhida por lá. Se a série faz sucesso, e ainda consegue atrair interesse do exterior, ótimo, é um bônus para eles. Durante muito tempo, a Toei, contudo, não dava muita importância ao mercado internacional. Se suas séries conseguissem fazer sucesso no exterior, era um lucro adicional, e por isso mesmo, eles não se esforçavam muito para que suas produções ganhassem fama no exterior, algo que acabava acontecendo às vezes por acaso, ou por esforço das empresas que compravam as séries nos países onde eram exibidas. Trocando em miúdos, no caso dos Super Sentais, se eles fizeram sucesso aqui nos anos 1980, isso foi mais mérito da Everest, que soube trabalhar o material, do que por mérito da Toei propriamente. Assim como Cavaleiros do Zodíaco se tornou um grande sucesso aqui pela Samtoy, que conseguiu fazer acordos que permitiram à série ser um verdadeiro estouro de audiência na TV Manchete. Não desmerecendo as séries propriamente ditas, claro, que caíram no gosto dos brasileiros, e se tornaram o fenômeno que foram em suas épocas. Só mais recentemente a Toei passou a trabalhar com mais afinco e dedicação para popularizar suas produções no exterior, deixando de confiar a terceiros essa tarefa.
                Quando Haim Saban propôs a compra das séries Super Sentai aos japoneses, era apenas uma relação comercial de compra e venda. Para a Toei, era um lucro a mais para seu caixa, e só. Acontece que Saban tentou várias vezes vender as séries nipônicas às TVs dos Estados Unidos, mas os norte-americanos, com aquele seu ego inflado, de achar que só eles são importantes, não tinham interesse em comprar séries que mostravam apenas orientais sendo os heróis. Estamos falando dos anos 1980, e precisamos lembrar que até mesmo nos animes, eles precisavam dar uma “ocidentalizada” na série, para facilitar sua aceitação, o que se conseguia ajeitar trocando os nomes dos personagens para nomes ocidentais, e dando um título mais gringo para a série. Tivemos exemplos como Speed Racer, Patrulha Estelar, Robotech, entre muitos outros. Até que Saban tentou o lance de “adaptar” as séries, para tentar vencer a resistência ianque, deixando apenas as cenas de lutas dos heróis transformados, e dos robôs com os monstros, e colocar cenas com atores ocidentais, fazendo uma bela misturada, e criando então os “Power Rangers”, que viraram um sucesso indiscutível por onde quer que a série fosse exibida. E não dá para culpar Saban por isso: como amante das produções japonesas, foi a saída que encontrou para poder vender as séries. Ele havia pago por elas, e tinha todo o direito de ter seu lucro com isso. E, outro detalhe que muitos esquecem: os japoneses aceitaram o que ele fez, indicando que seu contrato permitia tal coisa. Então, não se pode esquecer de colocar essa jogada também na conta da Toei, e não apenas na de Saban...
                Então, depois do “fenômeno” Power Rangers, cujos produtos ganharam o mercado de assalto, qual o problema para se exibir novamente séries Super Sentai no Brasil? Praticamente tudo, em se tratando de mercado e licenciamento, as maiores fontes de renda para quem atua neste setor. Ao invés de ter muito trabalho negociando com os japoneses para se trazer uma série do Japão (e eles sempre foram complicados para se fazer negócio), e ter que desenvolver um planejamento de exploração comercial para a série (algo que custa dinheiro), que ainda por cima, precisaria fazer sucesso para alavancar o potencial de comercialização dos produtos, porque não negociar com os americanos, que eram bem mais práticos, e ainda por cima já tinha todo um esquema de aproveitamento comercial calcado no imenso sucesso que a série fazia não apenas nos Estados Unidos, mas em diversos outros países? Não havia nem o que escolher, qualquer empresário iria optar pela opção que gerasse menos custos, e mais lucros potenciais. E como argumentar contra uma produção que estava fazendo sucesso em vários países, contra uma série que podia ter feito sucesso no Japão, mas que no fundo seria só um país, contra os vários outros onde a adaptação americana ia de vento em popa?
                Com os Power Rangers consolidados na exibição na TV, além da venda de uma infinidade de produtos licenciados, quem quisesse explorar uma série Super Sentai por aqui tinha que encarar custos muito maiores, e riscos também maiores de não conseguir lucrar com o produto. E, pela similaridade das séries, que compartilhavam cenas, e pelo fato de o público-alvo serem as crianças em sua maior parte, havia o problema potencial de as séries “originais” não serem vistas como tais? O empresário iria ter mais problemas para resolver isso, podendo ter de explicar qual série era de fato “original”. Ou será que ele gostaria de ver sua produção, trazida diretamente do Japão, e a muito custo lançada no mercado, ouvir um comentário como “Olha só... Imitação japonesa de Power Rangers!”, ou algo do tipo?

Timeranger foi transformada em Power Rangers Força do Tempo (acima). Toqger (abaixo), por outro lado, ainda não ganhou adaptação, e só é conhecida entre o nicho de fãs de tokusatsu.


                E, se levarmos em conta a situação difícil de ser empresário em nosso país, qual produto iria escolher para comprar e comercializar? Além disso, os fãs, apesar de ainda existirem, não conseguiam se mobilizar, ou o mais importante, mostrar que haveria um mercado potencial para ser explorado pela série Super Sentai “original”, ou pelo menos, que esse mercado fosse atraente o suficiente para o empresário apostar suas fichas. E se levarmos em conta que os gastos de todo o empreendimento seria maior do que o empregado na exploração da marca “Power Rangers”, seria preciso um potencial realmente absurdo de se atingir para conseguir mostrar que seria mais viável trazer a série japonesa do que sua versão adaptada ocidental. O problema sempre foi mercadológico, e não uma “proibição pura e simples” de se trazer as séries originais, por parte da Saban, como tanto se alegou. Se você fosse um empresário sério, iria arriscar a viabilidade do trabalho de sua empresa, apostando em uma operação muito mais arriscada, por puro preciosismo, ou birra purista? Não se trata nem de afirmar que empresários só pensam em dinheiro, e acima de tudo, só querem lucros. Lucrar não é pecado, mas estando no comando de uma empresa, da qual dependem não apenas você, mas todos os funcionários que emprega, é preciso ser responsável, e conduzir os negócios de maneira que seja a mais viável possível. Portanto, já faz um bom tempo que a exibição de séries Super Sentai acabou no Brasil, em se tratando de trazer novas produções para cá, ficando restrito, quanto muito, ao que já havia sido exibido por aqui. Não é algo que ocorreu agora. A Focus Filmes ainda conseguiu lançar Changeman e Flashman em DVD no mercado de vídeo nacional, mas ficou nisso. Assim como estamos tendo a oportunidade de rever Changeman na televisão. E só.
                E, na década passada, tivemos ainda outro problema que só agravou esse quadro, não especificamente em relação às produções japonesas, mas a todas as séries destinadas a público infantil, ou infanto-juvenil, quando o governo baixou normas proibindo propagandas direcionadas às crianças. O objetivo? “Proteger as crianças da exploração”, já que elas, coitadinhas, não tem discernimento para evitar de serem seduzidas pelas propagandas dos produtos... Uma idéia completamente cretina, que ajudou a inviabilizar a exibição de séries infantis na TV aberta, uma vez que as emissoras precisavam destas propagandas para que os horários gerassem retorno. E, no caso de uma série Super Sentai, como conseguir viabilizar os produtos, sem poder veicular nenhuma propaganda deles? Isso só aumentou ainda mais as chances de “concorrer” com Power Rangers, cuja marca já chegava ao Brasil amparada pelo sucesso obtido nos outros países, ao passo que Super Sentai, por aqui, se tornou algo completamente desconhecido do grande público. E, para se conseguir gerar lucro, é preciso mirar o grande público, pois um problema que nosso mercado consumidor, em se tratando de determinados produtos, é que ele não tem “massa crítica”, ou seja, dimensão e capacidade que permitem que um produto, mesmo sendo de um nicho específico, seja viável economicamente. Tudo isso tornou ainda mais difícil, e inviável economicamente, investir em uma série Super Sentai no Brasil, pois propaganda é algo indispensável para se divulgar produtos. Do que adianta produzir algo, se o público-alvo não tem conhecimento do que é lançado. E, voltamos ao problema deste tipo de produção precisar alcançar o grande público para se tornar mais viável com a venda de produtos, uma vez que os fãs de tokusatsu, infelizmente, por mais numerosos que sejam, podem não adquirir os produtos no volume de vendas necessário para se obter o lucro necessário para sustentar a operação. Só a exibição das séries em emissoras de TV, ou atualmente, nos sistemas de streaming, não costumam gerar lucros que sejam muito atrativos para os licenciadores. Pode até não dar prejuízo, mas séries de fama geralmente custam mais caro, de modo que os lucros precisam ser mais altos para se pagar os custos, e isso apenas complica ainda mais a situação.
                Para a Toei, deixar de veicular suas séries Super Sentai em países como o Brasil não fez os japoneses perderem o sono, muito pelo contrário. O contrato para adaptação das séries para a versão Power Rangers rendia uma boa grana, e a empresa japonesa não precisava fazer muito esforço para o sucesso das séries, o que ficava a cargo dos norte-americanos. E, para completar o clima de felicidade, a Bandai, que produzia a maior parte dos brinquedos de Super Sentai, faturava horrores vendendo os produtos rebatizados de Power Rangers. Daí, não adiantava esbravejar contra a adaptação ocidental, como muitos fizeram ao longo dos anos. Tudo sempre foi um negócio, e se fez um enorme sucesso, isso significa que agradou à maioria das pessoas. Se você faz parte da minoria que sempre detestou Power Rangers, infelizmente não há muito o que fazer, além de curtir as séries nipônicas através de fansubbers, com legendas em português, pois oficialmente, não há como as séries virem para nosso país, pelas dificuldades econômicas mencionadas, e que agora ficaram ainda mais complicadas pela aquisição de Power Rangers por parte da Hasbro.

Power Rangers RPM, adaptação da série Super Sentai Go-Onger, é considerada melhor que sua versão original japonesa, cujo enredo e histórias são considerados infantilizados demais por muitos fãs de tokusatsu.

                Outra discussão que sempre levanta polêmica foi a afirmação que as séries originais japonesas são muito melhores do que suas versões ocidentais. Isso é bem questionável, pois nos últimos tempos, o foco das séries Super Sentai foi ficando cada vez mais voltado para o público infantil japonês, de modo que os enredos e aventuras já não tem a mesma qualidade das séries antigas, onde podíamos ver histórias mais elaboradas e/ou dramáticas na franquia. De fato, algumas das produções mais recentes dos Super Sentai andam bem infantilizados, para se dizer a verdade, o que não quer dizer que as versões Power Rangers sejam melhores exatamente. No início, as séries nipônicas até podiam ser melhores, com certeza, mas de lá para cá, até mesmo as versões ocidentais passaram a ter seus méritos, com os norte-americanos sabendo criar aventuras e enredos que chegavam a ser até mesmo melhores do que os japoneses. Não é uma regra geral, claro. Da mesma maneira que os japoneses pisam na bola em alguns conceitos nas séries Super Sentai, Power Rangers também tem seus momentos de baixa. Os americanos aprenderam a fazer boas histórias com a franquia em diversos momentos, de modo que hoje não dá para dizer que um é melhor que o outro exatamente.
Gokaiger (acima) foi mal adaptado para Power Rangers Supermegaforce. Já Kiramager (abaixo) é a atual série Super Sentai em produção e exibição na TV japonesa, e possível candidata a adaptação futura pela Hasbro, atual detentora da marca Power Rangers.

                E, temos outro problema que só ajuda a complicar a situação, que são os próprios fãs. Muitos parecem merecer o apelido de “viúvas da Manchete”, vangloriando as produções daquele tempo, como se não houvesse nada mais, ou nada melhor além daquilo. Vivem “presas” às séries tokusatsu exibidas por aqui, como Jaspion, Changeman, Flashman, etc. Foram boas séries, e sim, merecem ser lembradas, e reverenciadas. Mas não endeusadas, como se fossem as melhores produções de todas, como se o que há além daquilo não fosse bom. Não é errado rever estas séries, como temos agora a chance de ver suas atuais reprises na TV Bandeirantes, aos domingos pela manhã. Mais do que rever séries que marcaram época, é uma chance também da geração atual conhecer tais produções, se já não tiveram como fazê-lo por meios não-oficiais. Mas é preciso entender, e aceitar, que elas podem não cativar os fãs atuais do gênero, como fizeram há cerca de 30 anos atrás. A audiência, para os padrões da Bandeirantes, até têm sido bons, mas nada de excepcional, como muitos gostariam que fosse. E isso joga um balde de água fria nos velhos fãs, por verem que suas preciosas séries parecem serem vistas como algo “comum” pela maioria da geração atual, que não vê nelas aquela maravilha toda que muitos sempre apregoaram. Há quem aceite isso, mas há quem não o faça, e pior, ainda fique revoltado com tal atitude, com os mais exaltados chegando até mesmo a ofender quem não louve a qualidade das antigas séries, gesto que não ajuda em nada na difusão dos tokusatsus, e muito menos na união que deveria haver entre os fãs destas produções, tanto quanto possível ser desejada. Porque sem união, nada conseguiremos.
                Se levarmos em conta que até mesmo Power Rangers não tem mais a fama de antes por aqui, como esperar que haveria maior atratividade trazendo as séries Super Sentai, pelas dificuldades existentes já mencionadas? E não é só isso: os fãs querem sempre produções oficiais sendo exibidas por aqui, mas e quando temos estas produções, muitas vezes eles não dão o apoio necessário para que ela seja viável financeiramente. Alguém se lembra de quando tivemos os filmes de Evangelion lançados no mercado de vídeo nacional, anos atrás? A Paris Filmes, que lançou o primeiro filme, fez um trabalho bem competente, lançando a produção tanto em Blu-Ray quando em DVD. Mas o que aconteceu? Os fãs não compraram o filme, ou melhor dizendo, não compraram o necessário para a operação dar o lucro necessário, tanto que o segundo filme acabou sendo lançado apenas em DVD, já que o número de unidades do BD vendeu ridicularmente baixo. E as vendas do segundo filme, por sinal, também não foram muito boas, ou pelo menos, não deu o lucro visado, pois a empresa não trouxe o terceiro filme. Não é nem o caso de falar que a empresa não lançou o produto direito, pois ambos os filmes foram lançados em DVD duplo, com vários extras, além de preços razoáveis para o mercado nacional, ao contrário de outra empresa que lançou uma conhecida série a preços altos, para depois reclamar que os números de venda não eram satisfatórios para a manutenção da operação. Neste aspecto, os fãs brasileiros mostram uma grande desunião, não havendo um esforço conjugado entre eles para se apoiar devidamente o lançamento oficial de uma série no Brasil, com raras exceções. E isso quando a série tem um lançamento competente e bem-feito pelo representante nacional. Tudo fica ainda pior quando as séries são lançadas de forma porca, ou sem um planejamento decente, o que só aumenta ainda mais a raiva dos fãs, que fazem o ambiente ficar ainda pior, chegando a desestimular potenciais empresas que poderiam investir no gênero, mas não o fazem, diante da chiadeira muitas vezes exageradas dos fãs, que descem o sarrafo pelo menor dos defeitos, ou simplesmente procuram pelo em casca de ovo...
                Voltando a lembrar que, para uma série ser produzida, ela tem de dar lucro, e para ser trazida para cá, é o mesmo requisito, pois o licenciante tem seus gastos, e para cobri-los, é preciso fazer um planejamento que permita a venda de produtos licenciados do mesmo. Mas o que acontece quando série X ou Y é trazida para cá, e os produtos não vendem porque os fãs não compram? Em nosso país temos o problema gritante da pirataria, que sempre ofereceu produtos de várias séries de forma não-oficial porque muitas vezes não tínhamos produtos oficiais por aqui. Mas isso acostumou mal muitos fãs, que preferem os produtos piratas por vários motivos, mesmo quando os produtos oficiais são encontrados a preços acessíveis. E aí, sem o lucro necessário, não dá para manter a oferta de produtos oficiais. E isso se aplica às séries de tokusatsu, que precisam gerar o seu lucro, para que possam ser trazidas para cá. Felizmente, algumas produções, como as séries e filmes da franquia Ultraman, tem tido a oportunidade de aparecer por aqui, ajudando a alegrar a vida dos fãs dos live-actions, que espero que possam se mostrar atrativas e viáveis economicamente.


A Boom! Studios tem lançado várias aventuras de Power Rangers com excelentes histórias, fazendo bom uso da mitologia da série (acima e abaixo).

                Infelizmente, quanto às séries Super Sentai, o acordo de compra da Hasbro sobre Power Rangers incluiu também os direitos das séries originais japonesas, e até o presente momento, não há como sabermos exatamente o que a empresa americana fará a respeito disso. Todos supõem que ela não vá liberar licenciamentos dos Super Sentai para esta parte do mundo, a fim de evitar que isso faça concorrência com Power Rangers. Nelson Sato afirmou que, quando seus contratos vencerem, não terá como renová-los pelo mesmo preço, indicando que a Hasbro cobrará valores que infelizmente não serão condizentes com as expectativas de lucro com as marcas por aqui. A Shout Factory!, que vinha lançando as séries Sentai originais que foram adaptadas para Power Rangers nos Estados Unidos, deixará de fazê-lo, por ordem da Hasbro. Fica a dúvida, contudo, se isso será mesmo o que a empresa fará, ou se irá lançar ela mesma as séries Sentai no Ocidente, capitalizando ela mesma com esta operação. Na dúvida, todos esperam pelo pior, de que não teremos mais estas séries de forma oficial no Brasil.
                Agora, será a vez da Hasbro ser demonizada pelos fãs nacionais, mas como já mencionei antes, não esqueçam dos japoneses, afinal, a Toei concordou e assinou o contrato firmado com a Hasbro, que pagou um bom dinheiro ao estúdio nipônico, que vai faturar duas vezes, explorando a marca Super Sentai no Japão, e recebendo pelos direitos de adaptação, e licenciamento feitos pela Hasbro, sem mencionar que a Toei já ganha um extra fornecendo as indumentárias (fantasias), além de cenas de lutas dos robôs que precisem ser feitas para as versões Power Rangers. Tudo são negócios, e infelizmente, os fãs brasileiros das séries originais nipônicas não tem força para mudar isso. Nunca houve a união necessária para isso, e não será agora que haverá uma mudança, uma vez que o acordo da Hasbro é muito mais abrangente do que o da Saban. Quem quiser assistir aos Super Sentai, terá de continuar a fazê-lo através de fansubbers, na pior das opções. E ainda há outra razão que deixará os fãs mais puristas irritados, que é o fato de que, graças a Power Rangers, a Toei continua produzindo Super Sentai até hoje. A franquia esteve perto de acabar nos anos 1990, devido à baixa audiência e vendas de produtos abaixo do ideal, mas com a venda dos direitos de adaptação para a Saban, a Toei ganhou uma fonte de renda extra com as séries Sentai, o que renovou a determinação de continuar produzindo as mesmas, para capitalizar com elas, e garantir os lucros exigidos pela direção do estúdio. Sem Power Rangers, a franquia poderia ter acabado, ou sofrido um hiato de produções, como ocorreu com a franquia Kamen Rider, que ficou anos sem ter novas produções no Japão. Exagero ou invenção? Talvez um pouco de ambas, mas o risco existia, e se as séries Super Sentai não tivessem acabado, mesmo assim poderiam ter corrido o sério risco de ter mesmo encerrado sua existência, como veio a ocorrer com as séries Metal Heroes.

Beast Morphers, adaptação da série Sentai Go-Busters, é a produção mais recente da franquia Power Rangers.

                As séries Sentai marcaram época quando foram exibidas no Brasil no final dos anos 1980 e início dos anos 1990. Infelizmente, devido a vários acontecimentos, nunca mais aquele sucesso estrondoso se repetiu, de modo que garantisse a exibição contínua das produções por aqui. Uma época que passou, e que não temos como retornar. Quem conseguiu comprar os DVDs de Changeman e Flashman lançados pela Focus, valorize-os. Google Five e Maskman, por outro lado, só serão possíveis de serem encontrados em versões piratas. Aceitar que vivemos outros tempos é a única opção que temos. Louvemos o passado, e tentemos usá-lo como exemplo positivo para seguirmos rumo ao futuro, da melhor maneira que pudermos. É o que podemos fazer para seguir em frente, e ao menos tentarmos ser felizes tanto quanto possível com nós mesmos. E torcer por dias melhores, e fazermos o melhor que pudermos quando houver a chance real de mudar a situação. Felizmente, para alívios dos saudosistas, os contratos atuais firmados por Nelson Sato ainda devem durar cerca de quatro anos, durante os quais as séries Changeman e Flashman ainda poderão ser veiculadas oficialmente por aqui, então, aproveitem as chances de reverem tanto quanto possível estas produções, ao menos de forma oficial, ajudando a divulga-las para aqueles que ainda quiserem conhece-las, mas sem exageros nisso. Que possam fazer uma divulgação positiva do material, e do que ele já representou, e ainda representa, para os fãs nacionais de tokusatsu, sem pachequismos ou revanchismos.
                Já com relação a Power Rangers, a Hasbro tem grandes planos para a franquia, que vem sendo muito bem explorada em séries recentes de quadrinhos lançadas pela Boom! Studios nos Estados Unidos, cuja mitologia hoje é tão rica e diversificada quanto a das séries Sentai japonesas. Mesmo admirando e preferindo estas, não é certo deixar de aproveitarmos o que vem sendo feito de bom com aquilo que nasceu de uma simples adaptação de uma série japonesa para atender ao gosto dos fãs americanos, e conseguiu ganhar vida e brilho próprios, no que a Hasbro está mais do que certa de fazer um bom aproveitamento do material que tem nas mãos, e torná-lo algo muito melhor do que jamais foi. Devemos valorizar a iniciativa da empresa no que for positivo para a franquia, pois o seu sucesso também ajuda as séries originais japonesas, que continuarão sendo produzidas, e servindo de base para novas adaptações no futuro, ajudando a manter a chama dos Super Sentais viva e seguindo em frente, mesmo que isso signifique não termos mais estas séries oficialmente por aqui. Dos males, o menor... E ao menos, quem quiser ainda poderá recorrer aos fansubbers para continuar acompanhando as produções japonesas...