quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

COLUNA HQ – JANEIRO DE 2021 – BANCAS EM EXTINÇÃO?

            No primeiro editorial deste ano, trato de um assunto que certamente impactará os leitores de quadrinhos brasileiros: o fim de nossas bancas de revistas, que a partir deste ano terão suas atividades ainda mais complicadas pela atitude da Dinap, única distribuidora nacional de revistas, que não irá mais trabalhar com o sistema de consignação de publicações, à exceção dos poucos títulos que restam da outrora poderosa Abril, algo que certamente poderá inviabilizar e decretar a morte deste tipo de estabelecimento em nosso país, onde muitos leitores conheceram os quadrinhos que passaram a curtir e a amar. Então, vamos à minha opinião sobre o assunto, e boa leitura a todos...


 

BANCAS EM EXTINÇÃO?

 


            A situação do mercado editorial no Brasil nunca foi exatamente um mar de rosas, mesmo em períodos de bonança econômica. Se com a economia indo bem, as coisas apenas seguiam em frente, em tempos de crise, sobrava dificuldades para todos, das empresas aos leitores. E esta última década até que teve alguns momentos bons, até que a crise econômica nacional começou a fazer suas vítimas. E no ano passado, com o advento da pandemia do coronavírus, o que já não andava bom, piorou ainda mais. E como desgraça pouca é bobagem, teremos mais notícias ruins para este ano de 2021, e que pode vitimar, em termos econômicos, muita gente ainda.

            Não é difícil de entender o motivo. Com a necessidade de isolamento social, muitos segmentos econômicos tiveram que fechar, com funcionários fazendo o chamado trabalho direto de casa, o tão propalado “home office”. Mas, muitas empresas fecharam, ou não tiveram como fazer isso. Mesmo com a flexibilização, a economia, apesar de reagir, continuou capenga, lembrando que antes de toda essa loucura começar, a economia já não ia bem, e patinava numa recuperação ainda incerta e sem garantias de êxito a curto prazo. Então, tudo ficou ainda mais complicado do que já era.

            E as editoras tiveram que se virar do jeito que dava. Lançamentos atrasaram, ou foram adiados, e cronogramas suspensos. Algumas editoras até conseguiram manter certa rotina de lançamentos, passado o baque inicial, outras não se recuperaram direito até hoje. Não apenas o trabalho de produzir e lançar novos títulos foi afetado, mas especialmente, a capacidade de consumo do público leitor, que mesmo tendo de ficar em casa, obviamente não podia gastar com revistas e gibis o que gastava antes, que por sua vez, já havia tido um grande impacto nos últimos tempos com a crise econômica. Com alguma recuperação da economia, conseguiu-se apenas estancar a sangria. O mercado editorial ainda está mal, e tudo pode ficar ainda mais complicado este ano, e vou explicar o por quê disso.

            Não é demais lembrar que, há algum tempo atrás, a Editora Abril praticamente faliu, o que causou um impacto sem precedentes no mercado editorial nacional. OK, na verdade, ela está em recuperação judicial, e sob uma nova direção e propriedade, mas os estragos promovidos no meio continuam, e estão piorando. Neste mês de janeiro, por exemplo, o parque gráfico da editora, na Marginal Tietê, em São Paulo, capital, foi desativado, em mais um desmantelamento daquilo que um dia foi o maior grupo empresarial do país. Mais algumas centenas de empregos que foram para o ralo. As revistas da editora, as que ainda sobraram, passarão a ser impressas em gráficas terceirizadas, fato inédito na história recente da Abril para publicações convencionais. Mas o problema maior está na mudança de atitude de uma das outras empresas restantes do Grupo Abril. Trata-se da Dinap, a distribuidora do grupo, que era encarregada da distribuição das publicações, não apenas da Abril em si, mas de diversas outras editoras do mercado, abastecendo bancas de todo o país.

            Em comunicado divulgado no mês de novembro passado, a empresa avisou que, a partir deste mês de janeiro, deixaria de praticar a distribuição de revistas no esquema de consignação para todos os seus clientes, à exceção da Editora Abril. Uma prática de décadas seria mudada, de forma unilateral pela empresa, que alegou que a crise da pandemia exigiu a tomada desta decisão, diante do impacto negativo que a situação desencadeou no cenário nacional de publicações, que já andava debilitado pela crise econômica. E claro, diante do descalabro gerencial perpetrado pela Família Civita na última década de comando do Grupo Abril, que reduziram a escombros o conglomerado. É uma mudança que tem tudo para prejudicar sobremaneira o mercado de bancas de revistas em todo o país, colocando sua sobrevivência em risco, e prejudicando inúmeros leitores que tem neste tipo de estabelecimento o seu principal meio de aquisição de revistas e gibis, além de outras publicações.


Comunicado da Dinap informando o fim do esquema de consignação para distribuição de revistas a partir de 2021.

             Para quem não sabe, o esquema de consignação, aplicado até então, consiste em que cada estabelecimento (banca) receba um número X de exemplares de determinada publicação. Destes exemplares, o estabelecimento tinha um tempo determinado para efetuar sua venda, de forma que, ao término do período, a publicação é recolhida e devolvida à empresa editora, onde é feita a compensação dos exemplares que foram vendidos, e a sobra do que não foi comercializado. Em um exemplo, se uma banca recebeu 10 exemplares de um gibi, se ele vendeu 5, no momento do recolhimento, foram devolvidos outros 5 exemplares, e o dono do estabelecimento paga apenas pelo número de exemplares não devolvidos. Em geral, o valor pago por exemplar de publicação vendida era de cerca de 30%, de modo então que se a publicação custava R$ 10,00, a banca recebia R$ 3,00, ficando os demais R$ 7,00 com a distribuidora, e com a editora, sendo que esta recebia em média o valor de 45% do preço da publicação. Estes são números exemplificativos, lembrando que os percentuais podem variar, geralmente para baixo, no que tange aos valores recebidos pelas bancas e pelas editoras.

            O ponto positivo deste esquema é que minimiza os riscos para os pontos de venda, que devolvem as revistas não vendidas para as editoras, que por sua vez, acabam arcando com os riscos de ficarem no prejuízo se determinada publicação não vender bem. Para a distribuidora, quanto mais revistas vendidas, melhor, pois ganha em cima disso. Parece bom, mas tem lá seus problemas, e o principal deles é que nos últimos tempos vinha se verificando um atraso cada vez maior para as bancas receberem suas partes das distribuidoras, agravando suas dificuldades financeiras. Mas, e agora, quando a Dinap, a única distribuidora nacional digna do nome, resolve não comercializar mais nestes termos? O que isso significa para as bancas?

            Significa a adoção de mais riscos na comercialização de revistas, e isso inclui os gibis. Se quiser continuar oferecendo o produto para venda, as bancas terão de comprar a publicação. O detalhe é que, diferente da consignação, a compra passa a ser definitiva: se a revista não vender, ela não será mais recolhida, e o dono do estabelecimento passa a arcar com o prejuízo dos exemplares não comercializados. O risco de vendas aumenta exponencialmente, de modo que não vender as revistas torna-se um prejuízo, e não um ganho menor, como vinha ocorrendo até então. Uma reviravolta na condição do negócio, que tem tudo para complicar, e talvez, até inviabilizar o funcionamento de inúmeras bancas pelo país inteiro, dependendo da situação de cada um, e de seu tipo de estabelecimento.

            Vale lembrar que, nos Estados Unidos, esse tipo de comercialização de revistas há muito vem sendo praticado pelas editoras de quadrinhos. No final dos anos 1970 e início dos anos 1980, o modo de venda dos gibis publicados pelas editoras na terra do Tio Sam ainda era no esquema de consignação. Mas as editoras conseguiram mudar para o sistema de venda direta, onde o lojista adquiria as revistas em definitivo. Não é preciso dizer que foi o melhor dos mundos para as editoras, uma vez que praticamente todos os riscos de encalhes passaram a ficar nas mãos dos lojistas. Foi o “boom” das comic shops, que se espalharam por todo o país, e se tornaram praticamente os únicos lugares onde gibis eram vendidos, com algumas exceções.

            Logicamente que os donos destes lugares passaram a basear suas compras de revistas nas encomendas dos clientes, que avisavam com antecedência quais títulos tinham interesse em adquirir. Isso dava ao lojista uma base de quantos exemplares comprar de cada publicação, com as editoras passando a distribuir listas com os títulos a serem comercializados com antecedência de alguns meses, de modo que as próprias editoras também podiam calcular melhor quantos exemplares deveriam ser impressos, de modo a evitarem também ficar com encalhes em seus depósitos. Por segurança, os lojistas sempre compravam alguns exemplares a mais, de modo a terem revistas para vender a clientes eventuais. Com base em suas experiências, eles podiam antever quais títulos podiam arriscar comprar mais exemplares “extras” do que outros, confiando na saída destes por meio de clientes que compravam gibis esporadicamente, ou não. O sistema, apesar de algumas falhas, funcionou bem para a maioria, até hoje. Mas estamos falando de um país com uma economia estável, onde boa parte da população tem um poder de compra razoável, e onde a maioria dos gibis custam barato.


Nos Estados Unidos, as Comic Shops substituíram as bancas como pontos de venda de revistas em quadrinhos a partir dos anos 1980, com a implantação da venda direta pelas editoras, pondo fim ao sistema de venda em consignação.

            Mesmo assim, é um sistema que exige volume de vendas para se manter, e nos últimos anos, a indústria de quadrinhos vem enfrentando dificuldades para manter o número de vendas. E, a exemplo do que está ocorrendo agora no Brasil, com relação à Dinap e as editoras clientes atendidas, nos Estados Unidos a relação das editoras com a Diamond, que poderíamos chamar de versão gringa da Dinap, também não anda muito boa, a ponto de recentemente a DC Comics, uma das gigantes do ramo, resolver retirar todas as suas publicações do catálogo da Diamond, passando a trabalhar com outro esquema de distribuição de seus títulos. Muitas editoras pequenas, por sua vez, reclamam de condições desfavoráveis de trabalho impostas pela Diamond, que privilegiava os grandes clientes, como a Marvel, Image, e a própria DC. Mas, se esta resolveu sair da lista de clientes, significa que até mesmo ela não andava contente com os resultados do trabalho oferecido.

            E aqui no Brasil, o que pode acontecer? Em um aspecto geral, os donos dos estabelecimentos ficarão com sua gama de opções de revistas ainda mais reduzida do que já está. E, com menos opções de produtos, menos vendas realizará. As publicações da Abril que ainda restaram obviamente não deixarão de serem oferecidas em consignação, mas como o número delas diminuiu bastante, o faturamento potencial das mesmas também declinou, para não mencionar que as vendas das próprias revistas também encolheram. Quanto a revistas e outras publicações de outras editoras, bem, muitos deixarão de vende-las, para não tomarem prejuízo de terem encalhes. Jornaleiros mais organizados podem até continuar revendendo estes títulos, adotando posturas bem conservadoras em termos de exemplares que irão adquirir, utilizando uma margem de segurança que pode ser mais ou menos arriscada, dependendo do conhecimento que tem de seu público fiel de longa data.

            Por exemplo, se ele sabe que sempre vendeu 10 exemplares de um título que não recebe mais em consignação, ele pode resolver adquirir uma quantia até este número, ou para se garantir, comprar apenas metade, tendo certeza de que irá vender sempre todos estes exemplares, pelo seu histórico de vendas. Mesmo assim, certamente não serão todos os jornaleiros que farão isso, e mesmo aqueles que o fizerem, certamente poderão adotar esta postura somente para certos títulos. A consequência é que as vendas cairão ainda mais, faturando menos, e refletindo também nas editoras, que vendendo menos revistas neste novo sistema, terão de rever seu leque de publicações, uma vez que as baixas vendas podem inviabilizar a manutenção da publicação. E menos publicações significam menos títulos para vender. E menos revistas publicadas resultam geralmente em vendas menores, que podem até comprometer a saúde financeira da própria editora, que pode se ver forçada a encerrar suas atividades, o que resulta em perda de empregos, algo que também irá se refletir nas bancas, que com menos revistas à venda, também podem se tornar inviáveis financeiramente.

            Para sobreviverem, as bancas terão inevitavelmente de diversificar suas atividades, buscando outros meios de obter renda. Pode parecer óbvio, e até fácil de se fazer, mas não é tão simples assim. Há casos de estabelecimentos que, tendo começado como simples bancas, cresceram e passaram a oferecer vários outros produtos e serviços. Conheço uma excelente banca na cidade de Santo André, na Grande São Paulo, que tendo começado como uma simples banca, com o passar do tempo foi diversificando suas atividades, passando a atuar como livraria e papelaria, loja de presentes, e mais recentemente, oferecendo serviço de lanchonete, e restaurante self-service, e continua trabalhando com a venda de revistas, ocupando um prédio grande, e garantindo dessa forma um faturamento mais garantido. Mas isso não é algo que qualquer estabelecimento pode fazer. Muitas bancas são pequenas, instaladas em estruturas metálicas nas calçadas, onde o espaço foi pensado apenas para a venda de revistas e publicações, mal comportando a presença de outros produtos que possam complementar a renda da venda de revistas e jornais.


Nos últimos anos, várias bancas de revistas tiveram que passar a vender outros produtos para complementar as atividades e garantir a subsistência, algo que poderá ficar ainda mais necessário a partir de agora, com as dificuldades econômicas do país, e a nova sistemática de trabalho da Dinap.

            E não é de hoje que o segmento de bancas enfrenta dificuldades. A crise econômica dos últimos anos já fez com que muitas bancas pelo país encerrassem suas atividades, mesmo com várias delas tentando oferecer outros produtos que garantissem sua subsistência. Outros estabelecimentos, apesar de não fecharem, passaram a não trabalhar mais como banca, o que na prática significa uma banca a menos. E, com a nova postura da Dinap, mais uma dificuldade surge, complicando ainda mais o cenário que não era bom.

            Até meados da década passada, a Dinap tinha uma concorrente no mercado de distribuição de revistas, a Chinaglia Distribuidora. Infelizmente, esta acabou sendo comprada pela empresa do Grupo Abril, que assim se livrou da rival, e praticamente garantiu um monopólio dos serviços de distribuição de revistas em todo o país. Na época muitos já avisavam que isso seria prejudicial ao mercado, mas lamentavelmente, nada foi feito na época, tanto pelo setor privado, que nunca viu nascer outra empresa do ramo que fizesse concorrência à Dinap, nem tampouco pelo setor público, cujo setor de regulamentação de mercado, o CADE, não impediu a criação do monopólio do setor por parte da Dinap. E esta empresa, a exemplo do que ocorria no restante do Grupo Abril, também começou a expor sua má administração, levando a um encarecimento e precarização de seus serviços aos estabelecimentos de venda por todo o país. Aumento nas taxas de valores de consignação, com as editoras e bancas recebendo cada vez menos por exemplar vendido, ao passo que os prazos de pagamento para estas empresas começaram a ficar cada vez maiores, iam pouco a pouco dificultando as condições de trabalho, com a distribuidora passando a ficar com a maior parte do bolo do negócio, com bancas e editoras passando a receber menos, e de forma mais demorada. Claro que uma hora isso poderia se tornar insustentável. E, havendo apenas uma distribuidora de alcance nacional, que outra opção havia? Nenhuma, praticamente. E agora, com esta decisão tomada de forma unilateral, encerrando a distribuição em consignação, bate-se o último prego em um caixão que pode comprometer todo o setor, ou na menos ruim das hipóteses, boa parte dele, gerando prejuízos para as editoras, bancas, e leitores.

            No caso das editoras que trabalham com quadrinhos em nosso país, a situação varia. Há quem será mais afetado do que outros. A Abril, que continuará com seus títulos em consignação para as bancas, infelizmente não edita mais quadrinhos desde que pôs fim à linha de revistas Disney. Outra editora, a Globo, já deixou de trabalhar com a Dinap na distribuição de seus títulos, mas ela também não edita quadrinhos há um bom tempo.

            A Panini, maior editora de quadrinhos do país atualmente, felizmente já não trabalhava mais com a Dinap há algum tempo, insatisfeita que estava com os serviços da empresa, e partiu para criar sua própria distribuição. Isso fez com que muitas bancas ficassem sem seus produtos por vários meses quando começou a fazer isso, mas depois a situação foi melhorando, com os títulos voltando a serem distribuídos com regularidade para muitas bancas. Ainda sofre alguns percalços, e a cobertura de sua distribuição ainda não atinge todas as localidades, mostrando que precisa melhorar o serviço, mas ao menos não irá ser impactada pela mudança feita pela Dinap em seu modo de trabalhar.

            No caso da JBC, a editora nipo-brasileira há algum tempo já havia tomado a decisão de abandonar a venda em bancas, também insatisfeita com a distribuição feita pela Dinap, e com a baixa rentabilidade que a queda das vendas neste meio vinha apresentando, preferindo concentrar suas vendas em livrarias e lojas on-line, canais que poderiam oferecer melhor retorno, o que segue fazendo até o presente momento.

            A Culturama, editora que assumiu as publicações de quadrinhos Disney no Brasil, após a Abril encerrar essa atividade, até tentou distribuir o material em bancas, algum tempo depois mas preferiu concentrar-se na sua própria rede de distribuição para fazer as revistas chegarem ao restante do país, de modo que não será afetada pela mudança implementada pela Dinap.

            Por outro lado, a Mythos Editora, que trabalha com os títulos da Bonelli Comics em nosso país, além de algumas outras revistas, tinha na distribuição em bancas o seu principal canal de vendas, e será a principal afetada com esta alteração nas condições dos serviços prestados. A editora teria conseguido firmar contrato com empresas de distribuição para assumir o abastecimento de bancas nas Grandes São Paulo e Rio de Janeiro, porém para o restante do país, a situação não é nada animadora.

            E algumas outras pequenas editoras que trabalham com quadrinhos, e que tinham nas bancas um de seus canais de distribuição também perderão esse meio de vendas. E isso certamente irá impactar sobremaneira nas vendas de seus títulos. Mas, conforme já mencionei, esse é um dilema tanto para as editoras quanto para as bancas, principalmente, que sempre foram o principal meio de se comprar revistas neste país. E em um momento de crise econômica, e pandemia ainda correndo solta, e piorando ainda mais a situação para todos, muitos certamente vão encerrar suas atividades, sem conseguirem se adaptar ou compensar as perdas de vendas que sofrerão.

            Para os amantes de quadrinhos, é a perda de um local que era ponto de referência por décadas. Quem nunca passou na banca, e vendo as revistas lá expostas, não começou ali a ser um leitor de HQs, ou de qualquer outra revista. Nos bons tempos, era praxe já ter decorado os dias em que revistas mensais chegavam nos estabelecimentos, e ir lá para comprar. E geralmente encontrando também outros leitores, e muitas vezes começando um bom papo, com direito a ganhar não apenas um colega leitor, ou colecionador, que acabava vindo a ser um amigo. Quantas amizades não foram forjadas nestes locais, além de outros relacionamentos?


A crise econômica dos últimos anos reduziu o número de revistas publicadas pelas editoras, que por sua vez, resultaram em menos vendas nas bancas, complicando sua viabilidade comercial.

            Logicamente que nem tudo eram flores. Por vezes, quando chegavam poucos exemplares, chegar antes na banca podia ser a diferença entre garantir seu exemplar, ou ficar com um buraco em sua coleção. Houve uma vez em que vi uma edição chegar em um dia, e quando voltei no dia seguinte para enfim poder comprar, ela já havia acabado. E olhe que haviam muitos exemplares, de modo que sem ter como comprar no primeiro dia não era um risco tão grande assim. Mas eram casos que aconteciam. E quando a distribuição falhava? Todo mundo ficava sem ter como comprar o seu exemplar... Na época, as editoras tinham um serviço de atendimento de números atrasados, geralmente vinham os detalhes no expediente das revistas, com as informações de como proceder. No caso das publicações da Abril, eles informavam que a disponibilidade era das últimas seis edições, ao preço da edição atual, mais custos de envio. Em uma época onde internet era um sonho, era preciso mandar uma carta para o endereço informado, geralmente da distribuidora, pedindo pela revista. Vinha uma resposta com os dados de pagamento, e então, era esperar. Bem diferente dos dias de hoje, onde o contato via internet, e o comércio on-line são muito mais amplos e com serviços muito mais ágeis e diversificados.

            E é isso mesmo que as editoras estão investindo no momento, no comércio on-line. Não é de hoje que as principais editoras de quadrinhos apostam na internet para incrementar suas vendas. Mas o que começou como um serviço para ajudar a desovar exemplares não vendidos hoje se tornou um canal imprescindível de vendas, com títulos sendo oferecidos até antes mesmo de serem lançados, nas chamadas pré-vendas. Além, claro, de oferecer as possibilidades de assinaturas, um recurso que já vem de longa data nas editoras, que garantiam a venda de vários exemplares das revistas que produziam, inclusive de quadrinhos.


Lojas virtuais das editoras Panini (acima) e Mythos (abaixo). Editoras procuram reforçar suas vendas diretas pela internet para compensar as dificuldades das vendas em bancas.

 

            Além de investirem em canais próprios, nos últimos anos, com o lançamento de edições encadernadas tendo se tornado um filão extremamente disputado pelas editoras, com a febre das edições de luxo, os quadrinhos passaram a ser vendidos também em livrarias e sites de comércio on-line, onde hoje é possível encontrar um sem-número de edições das mais variadas editoras do gênero, e de vez em quando podendo contar com algumas promoções e descontos em alguns títulos. Empresas como Amazon (a principal empresa de comércio on-line de livros do pais atualmente), Saraiva, Livraria Cultura (apesar de atualmente estarem combalidas, e com variedade de títulos muito menor que antigamente), e lojas especializadas em quadrinhos, como a Livraria Comix, são pontos de venda indispensáveis para as editoras, e os leitores, sendo agora o principal canal de vendas de quadrinhos atualmente.

            Os leitores precisam se cadastrar nas listas de lançamentos que as editoras costumam divulgar, a fim de poderem estar antenados com as revistas que estão sendo disponibilizadas, e assim, procurarem as mesmas no comércio on-line, seja através das lojas virtuais das próprias editoras, ou de outras empresas que comercializem produtos do gênero. Os antigos encontros de leitores em bancas infelizmente virarão coisa do passado, acabando por completo. Hoje, os encontros são virtuais, com os fãs e leitores interagindo em redes sociais e fóruns especializados na área, onde o pessoal troca suas impressões sobre os gibis, informações de lançamentos, etc. Perde-se aquele contato direto, onde perdíamos até horas conversando com a turma sobre o que acontecia nos lançamentos, e o que rolava nas histórias, e ficamos apenas no ambiente virtual, onde embora o contato seja menos pessoal, nos permite conversar com pessoas que jamais teríamos chance de encontrar pessoalmente, e em qualquer horário, e qualquer lugar do mundo.

            Assim como as videolocadoras nasceram, expandiram-se, e fatalmente viraram empresas em curso de extinção, devido aos serviços de streaming, e ao mercado de vídeo direto, as bancas de revista no Brasil podem ter o mesmo destino. Talvez ainda demore um pouco, uma vez que as bancas ainda têm o trunfo das vendas de jornais, algo que ainda sustenta boa parte do negócio de muitas delas, mas que mais dia, menos dia, também poderá ver o fim disso. Para algumas, contudo, até mesmo a venda dos jornais já se encontra em situação terminal, em algumas localidades, o que só complica uma situação já difícil. E, lamentavelmente, não perderemos apenas o que era um tradicional ponto de encontro de amigos e colegas de coleção, mas também de empregos de inúmeras pessoas que vivem disso, e que impactarão na já complicada situação econômica nacional, com muito mais gente desempregada do que já temos.

            Paralelamente a esse “prego” no caixão que está sendo a atitude tomada pela Dinap, as bancas já vem enfrentando outros desafios. A celeridade da internet, com informação praticamente instantânea, veio corroendo as vendas das revistas nos últimos anos, de modo que antes mesmo da crise econômica, várias bancas já precisavam lançar mão da venda de outros produtos para se manterem no negócio, uma vez que só a venda das publicações, para alguns jornaleiros, já não conseguia sustentar o ponto. E, como desgraça pouca é bobagem, em algumas cidades, como São Paulo, o poder público mais atrapalha do que ajuda, impondo condições de funcionamento e licenciamento de trabalho (afinal, muitas bancas ocupam as calçadas, que são espaços públicos, e que demandam autorização por parte da prefeitura para poder funcionar ali) que nem todos os proprietários têm condições de atender e cumprir. Um fim injusto para estes locais, que serviam de ponto de encontro de leitores há décadas, e não apenas no que tange a quadrinhos. No tempo do regime militar, as bancas chegaram a se tornar lugares visados pelas autoridades, justamente pelos encontros que intelectuais tinham nestes pontos, onde chegavam a discutir e compartilhar idéias nem sempre toleradas pelo regime.


Muitas bancas passam por dificuldades, e nem todas podem conseguir diversificar suas atividades para manterem-se economicamente. E por vezes o poder público também complica a existência das bancas que ocupam espaços públicos, como calçadas e praças, através de exigências burocráticas e outras implicâncias legais.


            Tempos em que as bancas só precisavam mesmo vender revistas e jornais para se manterem. Hoje, muitos donos precisam apelar para produtos como alimentos e serviços de recarga de celulares e etc., para poderem fechar o faturamento. E não escondem a tristeza de lembrar disso. E, para os amantes de quadrinhos, também foi um local muito importante, trocando idéias e novidades das revistas, e discutindo as histórias de seus personagens favoritos, assim como leitores de outras revistas faziam em relação a seus outros assuntos. Os quadrinhos agora podem desaparecer em definitivo das bancas, dependendo de como as editoras ainda mantiverem seus serviços de distribuição, mesmo tendo encontrado alternativas para não ficarem dependentes dos serviços da Dinap. Em vários locais e cidades pelo país, as dificuldades já estão presentes há algum tempo, com muitos pontos já reclamando da falta de revistas, em virtude de distribuidoras regionais que, também afetadas pela quebradeira da Abril, também acabaram em inúmeras dificuldades e fecharam as portas, deixando as bancas sem terem como receber novos materiais. E isso quando as próprias distribuidoras também não complicavam a situação, priorizando certos estabelecimentos em detrimento de outros, o que levou ao fechamento de muitos pontos, apenas por conveniência da empresa de distribuição que atendia a região. Decididamente, os tempos de bonança das bancas se foram, e o futuro é mais do que sombrio e desesperançoso, o que dá ainda mais saudade e lamentação pelos antigos tempos. Até porque parte da geração atual vai perdendo o interesse pela leitura, que deve ser feita de forma mais profunda e prazeirosa, mas que se contentam com uma leitura rápida na internet, muitas vezes sem entender direito o que está lendo, o que ajudou a derrubar ainda mais as vendas de publicações no país. O passado não consegue se manter no presente, lamentavelmente.


Já vai longe o tempo em que as bancas viviam abarrotadas de revistas e demais publicações (acima). Hoje a luta pela sobrevivência ficou bem difícil, e a tendência é piorar. Quem não conseguir se manter infelizmente vai fechar, aumentando o desemprego que já é alto no país.


             Foram tempos nostálgicos que infelizmente, se perderam para sempre, ficando hoje restritos a algumas lojas especializadas de quadrinhos que ainda existem em nosso país, mas em muito poucas cidades, se comparado ao número de bancas. Estas ainda subsistem como podem, mas a Dinap, com sua ruptura unilateral das condições de prestação de serviços, encaminha para sua inviabilidade econômica, apressando o fim de muitas delas, mais rápido do que se poderia imaginar. Já vi várias bancas desaparecerem, e algumas que deixaram saudades, não apenas pelos encontros que tinha por ali, mas pelo momento mágico de achar nelas revistas que eu comprava e sempre aguardava ansiosamente pela próxima edição. São tempos dos quais sentiremos muitas saudades. Gostaria que tudo fosse diferente, e as bancas pudessem sobreviver com mais dignidade. Infelizmente, atitudes como as da Dinap, por mais erradas que possam parecer, ficam fora do controle das bancas.

            E as dificuldades não são apenas nossas. Até mesmo o mercado de quadrinhos nos Estados Unidos enfrenta problemas, com inúmeras comic shops sucumbindo à crise econômica provocada pela pandemia por lá. Muitas lojas, que eram incrivelmente numerosas por todo o país, fecharam e não terão mais condições de reabrir. Algo que tinha acontecendo até devagar, diante das quedas dos números de vendas, por causa de muitas histórias ruins e decisões editoriais malfeitas em tempos recentes, mas que ganhou um impulso absurdo com a pandemia da Covid-19. Assim como nós, os fãs de quadrinhos por lá também estão perdendo estes locais onde se confraternizavam e compravam seus gibis.

            Resta apenas tentarmos nos adaptar aos novos tempos que virão. Então, segue uma pequena lista de onde se pode efetuar compras on-line das principais editoras de quadrinhos em nosso país. Elas podem não ser tão legais quanto o ambiente das bancas que tínhamos, mas é onde teremos que buscar nossas publicações hoje em dia, e continuarmos a praticar nosso amor pelas revistas e gibis que tanto gostamos de ler e colecionar...

 

SITES DAS EDITORAS:

 

LOJA OFICIAL DA PANINI

 

https://loja.panini.com.br/

 

LOJA OFICIAL DA MYTHOS

 

https://www.lojamythos.com.br/

 

LOJA OFICIAL DA CULTURAMA

 

https://www.compreculturama.com.br/

 

LOJA OFICIAL DA NEWPOP

 

https://www.lojanewpop.com.br/

 

LOJA OFICIAL DA JBC (assinaturas)

 

https://editorajbc.com.br/assine/

 

JAMBO EDITORA – LOJA OFICIAL

 

https://jamboeditora.com.br/categoria/quadrinhos/

 

 

OUTRAS LOJAS:

 

AMAZON BRASIL

 

www.amazon.com.br

 

COMIX BOOK SHOP

 

www.comix.com.br

 

LIVRARIA SARAIVA

 

www.saraiva.com.br

 

LIVRARIA CULTURA

 

www.livrariacultura.com.br

 

LIVRARIA LEITURA

 

www.leitura.com.br

 

LOJAS AMERICANAS

 

www.americanas.com.br

 

SUBMARINO

 

www.submarino.com.br

 

OMNIVERSE

 

https://omniverse.com.br/

 

COMIC BOOM!

 

https://comicboom.com.br/

 

COMIC HUNTER

 

http://www.comichunter.com.br/

 

LOJA MONSTRA

 

https://lojamonstra.com.br/

 


Muitas cidades pelo país afora já perderam suas bancas, ou viram elas ficarem reduzidas a números ínfimos.

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