Este mês
de abril foi difícil para os fãs dos quadrinhos nipônicos em todo o mundo. Além
do falecimento de Kazuhito Kato, mais conhecido como “Monkey Punch”, autor da
clássica série “Lupin III”, outro artista de renome do mercado de mangás no
Japão também faleceu. Desta vez, foi Kazuo Koike, que morreu no último dia 17,
aos 82 anos. Curiosamente, o motivo da morte de Koike foi o mesmo de Kato:
ambos foram vitimados por uma pneumonia. Koike, aliás, havia manifestado seu
pesar pelo passamento de Kazuhito Kato, a quem se referiu como seu primeiro
“rival” profissional no mercado de mangás, uma vez que em suas respectivas
épocas, seus trabalhos no mercado editorial competiam entre si pela preferência
dos leitores da revista Weekly Manga Action, onde suas principais séries foram
publicadas. Os fãs do trabalho de ambos mal poderiam imaginar que, após a perda
de Monkey Punch, Kazuo Koike engrossasse a lista de perdas no mercado
editorial.
Natural da cidade de Daisen, na
ilha de Honshuu, Koike, cujo nome real era Seishuu Tawaraiya, nasceu em 8 de
maio de 1936. Ele iniciou sua carreira profissional na área dos mangás em 1960,
quando se tornou assistente de Takao Saito, criador de uma das mais longevas
séries de mangás publicada até hoje, Golgo 13, com Koike roteirizando várias
aventuras do personagem. Em 1970, Koike, em parceria com Goseki Kojima, criaria
aquela que é sua obra mais famosa mundialmente, a série “Kozure Okami”, conhecida
no Ocidente como “Lobo Solitário”, que foi publicada na revista Weekly Manga
Action, tendo estreado em setembro daquele ano, e sendo encerrada em abril de
1976, totalizando 28 volumes encadernados. Lobo Solitário tornou-se uma série
muito popular no Japão na época, a ponto de ganhar vários filmes com atores,
estrelados por Tomisaburo Wakayama, além de peças teatrais, e uma série de TV
estrelada por Kinnosuke Yorozuya.
Na
história, que se passa no período Edo da história japonesa, somos apresentados a
Itto Ogami, um exímio guerreiro samurai que ocupa o posto de assassino
“oficial” do shogun, a autoridade de fato no Japão, tendo a tarefa de eliminar
os inimigos de seu senhor, além de executar quaisquer pessoas que o shogun
determinar. Mas uma trama sórdida perpetrada pelo clâ Yagyu, inimigo político
da família Ogami, faz com que Itto seja acusado de traição contra o shogun, e
ainda assassinando toda sua família, de modo que, pelas regras da honra dos
guerreiros samurais, ele deveria se matar para redimir-se de sua culpa, de modo
que a família Yagyu assumiria a posição de assassina oficial do shogun,
aumentando sua força e influência. Mas Ogami, contrariando as expectativas dos
inimigos, não se matou, preferindo tornar-se um samurai errante. Ele foge com seu
filho, Daigoro, passando a viajar de forma errante pelo Japão, aceitando
trabalhos diversos para suas habilidades de samurai, ao mesmo tempo em que foge
de seus algozes e planeja vingança contra eles. Ogami é um samurai de
habilidade ímpar, e possuidor de conhecimentos que o tornam um guerreiro
temível. A força do enredo, e o impacto visual da arte de Kojima exerceram
forte influência em inúmeros artistas na época, e posteriormente, e não apenas
no Japão. Entre os artistas ocidentais de renome que não escondem sua admiração
pela série de Kazuo Koike está Frank Miller, que usou sua inspiração na série
nipônica em suas criações Ronin e Sin City.
Mas
Koike trabalhou em várias outras séries, várias delas em parceria com outros
artistas. Uma delas foi “Shurayuki-hime”, conhecida como Lady Snowblood, junto
com Kazuo Kamimura, publicada entre 1972 e 1973 na revista Weekly Playboy da
editora Sueisha, em 4 volumes encadernados, e que acabou ganhando também um
filme com atores. Na mesma época, lançou também “Kubikiri Asa”, ou “Samurai
Executor”, também em parceria com Goseki Kojima, cuja história até se passa na
mesma época de Lobo Solitário, com publicação na revista Shuukan Gendai da
editora Kodansha, em 10 volumes encadernados, de 1972 a 1976. A exemplo de Lobo
Solitário, Samurai Executor também ganhou uma adaptação como série de TV,
estrelada por Go Wakabayashi, que interpretou o personagem principal da
história, o também samurai Yamada Asaemon.
Na
segunda metade dos anos 1970, Koike deu início ao seu projeto Gekiga Sonjuku, que
consistia em um curso universitário destinado a ensinar as pessoas interessadas
na área em como se tornar um artista profissional de mangá. E entre os alunos
que frequentaram o seu curso encontramos os nomes de Rumiko Takahashi (autora das
séries “Urusei Yatsura”, “Maison Ikkoku”, “Ranma ½”, e “Inuyasha”, todos mangás
de grande sucesso, entre outras séries), Tetsuo Hara (o criador de “Hokuto no
Ken”), Takayuki Yamaguchi (autor de “Apocalipse Zero” e “Shigurui”), e Keisuke
Itagaki (criador de “Grappler Baki”), entre outros que se tornaram grandes
artistas profissionais no mercado japonês.
Outra
parceria prolífica de Koike foi com o artista Ryoichi Ikegami. Juntos, eles
criaram a série “Kizuoibito” (“Wounded Man”, em inglês), compilada em 11
volumes, tendo sido publicada na revista Big Comic Spirits da editora
Shogakukan de 1983 a 1986. Ambos retomariam a parceria na série “Kuraingu
Furiman” (“Crying Freeman”), publicada também na Big Comic Spirits, de 1986 a
1988, rendendo 10 volumes encadernados. Ambas as séries ganhariam versão em
animação, lançadas diretamente para o mercado de vídeo japonês, no formato OVA.
Wounded Man teve 5 episódios, enquanto Crying Freeman teve 6 capítulos. Esta
série ainda ganharia uma produção longa-metragem para cinema franco canadense
estrelada por Mark Dacascos.
Em 2003,
Koike produziu a continuação da saga de Lobo Solitário, “Shin Kozure Okami” (“O
Novo Lobo Solitário”) agora estrelada pelo filho de Itto Ogami, Daigoro, em
parceria com o artista Hideki Miri Mori substituindo Goseki Kojima, que havia
falecido em janeiro de 2000, aos 71 anos. Esta série retoma a história de onde
a série original havia parado, e foi publicada na revista Weekly Post da
editora Shogakukan, até 2006, totalizando 11 volumes.
Durante sua longa carreira,
Koike também roteirizou algumas histórias de super-heróis das editoras dos
Estados Unidos, entre elas X-Men, de forma esporádica. O artista recebeu
diversos prêmios ao longo dos anos, tanto no Japão quanto nos Estados Unidos e
na Europa, por seus diversos trabalhos.
No Brasil, suas
obras mais conhecidas são justamente Lobo Solitário e Crying Freeman, que foram
publicados por mais de uma editora. A saga de Itto Ogami foi lançada em nosso
país originalmente pela editora Cedibra, em 1988, de forma incompleta, com
apenas 9 volumes publicados. Em 1990, a Nova Sampa Editorial lançaria a série
novamente no mercado, chegando a 14 volumes lançados. Somente em 2004 os
leitores nacionais teriam a chance de conhecer por completo a história mais famosa
de Koike, com a Panini lançando todos os 28 volumes de Lobo Solitário.
Recentemente, a Panini relançou a obra no mercado nacional, com um novo
acabamento e tradução, tendo lançado também todos os 11 volumes de O Novo Lobo
Solitário, a sequência da história, permitindo aos fãs e leitores verem toda a
história da saga de Itto Ogami e seu filho Daigoro. Crying Freeman seria
publicado, incompleto, pela Nova Sampa, com 4 volumes, em 1990, e completo,
pela Panini, em 2006 e 2007. O filme live-action com Mark Dacascos foi lançado
no mercado de vídeo nacional, pela Paris Filmes, assim como todos os filmes de
Lobo Solitário produzidos no Japão nos anos 1970, pela Versátil, todos em DVD.
A versão animada de Freeman continua inédita por aqui, mas a série de TV do Lobo
Solitário chegou a ser exibida por aqui nos anos 1980, com o nome de “O Samurai
Fugitivo”, pela TVS/SBT.
Outra
obra de Koike que chegou a ser lançada por aqui foi Shurayuki-hime, através da
editora Conrad, que publicou toda a série entre 2006 e 2007. Várias das outras
obras do artista nunca chegaram a ser publicadas por aqui, nem mesmo quando os
quadrinhos japoneses se tornaram uma febre no mercado editorial nacional na
década passada e se tornando relativamente comuns em nosso país desde então.
Koike já
vinha tendo problemas de saúde devido à idade avançada, e vinha tentando se
manter ativo tanto quanto podia, como forma de manter a saúde em boas
condições. Todos os fãs, no Japão e pelo mundo afora, lamentam sua perda.
Descanse em paz, velho guerreiro. Suas obras, felizmente, continuarão a ser
publicadas, mostrando o seu talento e sua capacidade de contar histórias
interessantes, capazes de cativar leitores em todo o mundo.
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