Depois
de mais de 15 anos de negociações, há pouco tempo atrás uma das maiores
discussões de direitos sobre um personagem clássico de quadrinhos finalmente
chegou a bom termo e ficou definido: a Marvel Comics iria trazer Miracleman de
volta ao mercado. E a editora iniciou 2014 com o lançamento da primeira edição
do personagem inglês, para alegria dos seus velhos fãs, que puderam, enfim,
rever o antigo herói.
MIRACLEMAN N° 1 inicia a mais nova publicação do
personagem, que não era visto desde a falência da Eclipse Comics, há cerca de
20 anos atrás, última editora a lançar as aventuras do herói. Por enquanto, o
título mensal da Marvel vai republicar na íntegra as fases anteriores, criadas
por Alan Moore, seguidas pela fase de Neil Gaiman. Histórias inéditas, somente
a partir de 2015, ainda sem data definida. A edição de estréia reimprime o
material apresentado originalmente nas revistas "Warrior" N° 1, e
"Miracleman" N° 1. O preço da edição é de US$ 5,99, e traz uma nova
capa, além das artes originais totalmente digitalizadas e com os textos dos
balões refeitos. Todas as histórias também foram recolorizadas, mas mantendo
fidelidade à apresentação original.
O
personagem foi criado na Inglaterra pelo ilustrador e escritor britânico Mick
Anglo em 1953 para a editora Len Miller & Son. A editora publicava as aventuras
do Capitão Mavel, da Fawcett Comics. Mas, com o processo enfrentado pela
Fawcett movido pela DC Comics de que o Capitão Marvel era um plágio do
Super-Homem, a editora encerrou a produção de quadrinhos do herói. Para não
perder o público leitor, a Len Miller & Son resolveu dar uma
"maquiada" nos personagens, e produzir suas próprias histórias,
usando a base da Família Marvel. Assim, Mick Anglo praticamente criou uma
"cópia" do herói da Fawcett, mudando vários detalhes, e nomeando sua
criação como "Marvelman". Na nova história, o jovem repórter Mick
Moran (que tem a fisionomia quase idêntica à de Billy Batson, mas apresentando
cabelo loiro, e não moreno) ganha superpoderes através de um cientista (ao
invés do mago Shazam) ao pronunciar a palavra "kimota", e passa a
agir como o super-herói Marvelman. Logo ele ganha a ajuda de Dicky Dauntless,
um adolescente que se transforma no Young Marvelman; e de Johnny Bates, que se
transforma no Kid Marvelman; ambos dizem a palavra mágica "Marvelman"
para ganharem os super-poderes, cujas transformações também aconteciam através
de um relâmpago, a exemplo do que Billy Batson, sua irmã Mary, e seu amigo
Freddy Freeman faziam nas aventuras da Fawcett. Extra-oficialmente, no universo
das histórias em quadrinhos, a antiga Família Marvel tinha
"preferido" voltar a serem pessoas normais, e os "novos"
personagens seriam seus sucessores. Forçado ou não, a empreitada deu certo, e
os leitores ingleses puderam curtir inúmeras aventuras do "clone" do
Capitão Marvel e seus novos parceiros de aventuras por vários anos. E pelo
menos Mick Anglo criou um uniforme bem legal para o novo herói, diferenciando
seu visual do velho Capitão.
O
personagem foi publicado até o início dos anos 1960, para retornar somente no
início dos anos 1980, em uma nova série escrita por ninguém menos do que Alan
Moore, que atualizou o personagem ao mesmo tempo em que manteve o conhecimento
das aventuras originais vividas pelos personagens. Esta nova série, publicada
pela Quality Communications, passou a ser uma das séries do novo título
"Warrior", e mostrava um Mick Moran já adulto, que acaba
redescobrindo sua identidade de super-herói, esquecida há muitos anos, passando
a ver seu mundo atual virar literalmente de cabeça para baixo, ao descobrir que
muita coisa de seu passado nunca foi como imaginava. Esta série foi muito
elogiada pelos leitores, pela maneira adulta e trágica como o personagem foi
mostrado, acabando com aquele ar inocente das aventuras de antigamente.
Marvelman precisou lidar com acontecimentos dolorosos envolvendo seus próprios
amigos e aliados, e tendo de fazer escolhas difíceis. Alan Moore engrandeceu o
personagem a tal ponto que nem se mencionava mais sua origem como uma espécie
de "plágio" do velho Capitão Marvel como um demérito. Marvelman,
enfim, ganhava aura própria.
A
série foi encerrada de forma prematura, sem uma conclusão, na edição N° 21 de
Warrior. Pouco tempo depois, a editora americana Eclipse Comics adquiriu os
direitos de publicação do personagem, e passou a publicar novas aventuras,
ainda com roteiros escritos por Alan Moore, que deu sequência ao trabalho
desenvolvido na revista Warrior. Esta nova série também marcou a mudança do
nome do personagem para Miracleman, uma vez que a editora Marvel Comics havia
feito o registro do nome "Marvel", de modo que ele não poderia mais
ser utilizado para denominar uma série.
Alan
Moore deixou de escrever as aventuras do herói após a edição 16 da Eclipse,
passando os roteiros a serem feitos por Neil Gaiman. A falência da editora,
contudo, encerrou a publicação da revista, sendo a edição 24 a última lançada, apesar da
história da edição 25 ter sido concluída. Em 1997, os direitos do herói foram
adquiridos por Todd McFarlane, criador do Spawn e um dos fundadores da Image
Comics. McFarlane pretendia ressuscitar o herói, mas nunca levou o projeto
adiante, e sua insistência em manter os direitos iniciou um longo período de
negociações por parte de interessados em republicar Miracleman,
entre eles Mick Anglo, criador do personagem, Neil Gaiman, seu último
roteirista, e a própria Marvel Comics, que tinha suas próprias idéias para o
personagem. A batalha se desenrolou principalmente pelo fato de McFarlane ter
adquirido os espólios da Eclipse, e para Gaiman, os direitos de Miracleman não
estariam incluídos nestes espólios. As discussões prosseguiram praticamente
pela década inteira, até que Mick Anglo conseguiu enfim os direitos de volta, e
em negociação com a Marvel, a editora americana enfim adquiriu os direitos do
personagem, em 2009, e prometeu trazê-lo de volta ao mercado dos quadrinhos, o
que cumpriu neste início de 2014, com o lançamento desta nova série mensal que
republica as aventuras originais do herói. E o melhor de tudo: a Marvel irá
lançar a edição 25 do personagem, que teve a história finalizada, mas nunca
publicada, e deverá dar sequência às aventuras desenvolvidas por Gaiman, após
finalizar a republicação dos materiais da Warrior e da Eclipse, portanto, os
fãs do herói que se preparem.
No
Brasil, Miracleman teve raríssimas aparições. Na década de 1950, quando a RGE
publicava a revista do Capitão Marvel, o personagem chegou a ter algumas
histórias publicadas na mesma revista, com o nome de Jack Marvel. Em 1989 e 1990, a pequena editora
Tanos publicou 4 edições do herói, com arte em preto e branco, mostrando as
aventuras da revista Warrior para o público brasileiro. E foi só.
Fica
agora a expectativa de a Panini, atual editora Marvel no Brasil, ter interesse
de lançar este material no mercado nacional. O material desenvolvido por Alan
Moore, e posteriormente por Neil Gaiman, é muito bom, e merece ser lançado de
maneira decente em nosso país, que infelizmente sempre teve poucas opções de
ler aventuras em quadrinhos de heróis ingleses. As chances podem ser boas de
vermos tal material por aqui em médio prazo, afinal, com nomes do quilate de
Moore e Gaiman no comando das histórias, é garantia de qualidade nos roteiros.
Quem curtiu Watchmen e Sandman que o diga...
Por
enquanto, apenas podemos comemorar o retorno de Miracleman, e que tenha longa
vida neste seu novo renascimento nos quadrinhos...
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